Manifesto de apoio ao Movimento Ocupe Estelita

02/08/2014 12:09

As entidades da sociedade civil e movimentos sociais abaixo signatários vem, por meio desta nota pública, declarar apoio ao Movimento Ocupe Estelita, por ser esta uma luta de todas as pessoas por cidades mais justas, democráticas e populares.

O Movimento Ocupe Estelita, defendendo uma cidade verdadeiramente popular, articula há cerca de três anos debates nas redes sociais, ocupação intensa dos espaços públicos, atuação jurídica e atos e ocupações de rua, especialmente no Cais José Estelita. O Cais trata-se de uma ampla área histórica estrategicamente localizada no centro do Recife, uma das últimas frentes d’água não edificadas da cidade que, ademais, tem enorme potencial para a integração urbana e teve em 2008, 10,1 hectares (o equivalente a 10 campos de futebol), originalmente pertencentes à RFFSA, leiloados para iniciativa privada sem vinculação a qualquer processo de planejamento urbano.

O projeto nomeado “Novo Recife”, proposto para a área por um Consórcio formado pelas empresas Moura Dubeux, Queiroz Galvão, GL Empreendimentos e Ara Empreendimentos, promete a suposta “revitalização” do centro da cidade. Entretanto, o projeto materializa-se de forma extremamente segregadora e agressiva, uma vez que propõe a construção de 15 torres com cerca de 40 andares cada, constituídas em meio a edifícios garagens, que preveem estacionamento para mais de 5000 carros e quarteirões cercados por guaritas e segurança privada, alheios às ruas e à frente d’água.

Se construído, o “Novo Recife” intensificará diversos problemas endêmicos da cidade que se manifestam no Cais, como a segregação social, a péssima mobilidade urbana, o desrespeito à memória e à paisagem, a falta de equipamentos públicos e áreas de lazer que dialoguem com seu entorno, que é possuidor de um grande déficit habitacional e de clara desigualdade social, além do que, alavancará extrema pressão fundiária sobre as áreas populares vizinhas, sobretudo por ser, o Cais José Estelita, uma estratégica área de ligação da cidade. Tudo que seja ali construído terá um impacto intensificado sobre todo o Recife.

O processo de aprovação do projeto é atualmente questionado por duas Ações Civis Públicas, por parte do Ministério Público Federal e do Ministério Público Estadual e três Ações Populares que levantam diversas irregularidades desde o leilão em 2008, até a análise pelo Conselho de Desenvolvimento Urbano em 2012, passando pela falta do plano urbanístico para a área, que é exigido em lei específica, de Estudos de Impacto Ambiental e de Vizinhança obrigatórios e de efetiva participação popular. Até hoje, nenhuma das cinco ações em que o projeto Novo Recife é réu teve sentença, portanto, todas ainda aguardam julgamento.

O total desrespeito cometido pelas empresas Moura Dubeux, Queiroz Galvão, GL Empreendimentos, Ara Empreendimentos e pela Prefeitura do Recife permitiu a consideração e aprovação de um projeto que a população do Recife ou não conhece, ou não aceita. Com um alvará irregular, o Consórcio iniciou no dia 21 de maio de 2014 a demolição dos históricos galpões de açúcar do Cais. A reação foi imediata: as pessoas preocupadas com o futuro da cidade ocuparam o terreno visando impedir a apropriação elitista e unicamente pautada no lucro, conseguindo, enfim, evitar a conclusão da demolição, provocar o embargo da obra por recomendação federal, através do IPHAN e do Ministério Público e iniciar uma negociação com a Prefeitura do Recife para a revisão do projeto. A morosidade da justiça é um fator com o qual os empresários contam para execução de um projeto ilegal.

A mobilização tomou proporções internacionais. Transformando o Cais em um local de debate, formação política, manifestação cultural e de exercício democrático popular. O Ocupe Estelita demonstrou sua força ao enfrentar os problemas vividos cotidianamente no Recife e fez confluir diversos outros movimentos e suas lutas, tais como o combate às opressões; as lutas por moradia, o direito à cidade e de gênero; o debate sobre os efeitos do neodesenvolvimentismo, a abordagem de grupos em situação de fragilidade social e adicção; os resquícios do Regime Militar na máquina pública do Brasil atual etc.

No dia 17 de junho, quando ocorreu o jogo do Brasil na Copa da FIFA, o movimento foi surpreendido com uma ação policial truculenta, que a pretexto do cumprimento de uma ordem judicial, deixou dezenas de pessoas feridas, com balas de borracha, gás de pimenta, chicotadas, golpes de cassetetes e bombas de efeito moral, trazendo claramente à tona a criminalização dos movimentos sociais no Estado Brasileiro hoje e os efeitos nocivos de sua militarização. A ação violenta, entretanto, ocorreu ainda fora dos limites territoriais da decisão que servia de pretexto à ação da polícia e durante todo o dia, mesmo após a reintegração de posse do terreno já ter sido concluída. Acordos firmados com o Governo do Estado de Pernambuco para garantir que eventual cumprimento de ordem judicial seria avisado e acompanhado da presença do Ministério Público foram desrespeitados. Os advogados e as advogadas do Movimento Ocupe Estelita foram impedidos de acompanhar o cumprimento da ordem, ao passo que os do Consórcio, escoltavam toda a ação. É importante registrar que a esta se soma a uma série de outros ataques que já vinham acontecendo e sendo divulgados: perseguições políticas, espionagem virtual e ameaças a diversas pessoas que militam a favor do movimento.

Comprovando a ideologia por trás desse empreendimento, após a reintegração de posse, a área do Cais José Estelita – a partir da ocupação, um espaço tomado de uma vida pulsante, popular e política – tornou-se, por decisão autoritária das empreiteiras, um verdadeiro campo de concentração com arame farpado, cães de guarda, câmeras de segurança, e dezenas de guardas armados.

Apesar da violência policial sofrida e de todos os desafios em conduzir um movimento custeado apenas por autogestão popular, frente a um projeto bilionário e uma estrutura perversa de poder, o Movimento ocupou a área debaixo do Viaduto Capitão Temudo e continuou resistindo. A ocupação manteve-se e ampliou o convite à cidade para discutir o projeto “Novo Recife” e a destinação do espaço urbano.

Entendendo o Cais José Estelita como uma metáfora do crescimento do Recife e de diversas outras cidades brasileiras e por lutar pela garantia de uma cidade que seja partilhada por todas as pessoas, o Movimento Ocupe Estelita aponta como pauta objetiva a anulação dos procedimentos administrativos que aprovam o “Projeto Novo Recife”, uma vez que os mesmos encontram-se repletos de irregularidades, exigindo o cumprimento fiel das leis, como o parcelamento prévio do solo, a aplicação do Plano Diretor de 2008 e a efetivação da participação popular, indispensável para a discussão de qualquer projeto para uma região tão relevante para a cidade. Como também, a realização do plano urbanístico previsto para área do Cais pela Lei municipal de nº 16.550/2000 e que nunca foi feito.

Considerando a relevância da luta pela democratização da cidade;

Considerando a luta contra a predominância dos interesses da iniciativa privada sobre os de ordem pública, especialmente com a disponibilização de territórios da união para empreendimentos privados;

Considerando a luta contra a criminalização dos movimentos sociais;

Considerando o Movimento Ocupe Estelita como legítima expressão dos anseios de amplos setores da cidade do Recife e da sociedade brasileira como um todo;

 

 

Assinam este manifesto:

1.      Action Aid

2.      Ação Darmata

3.      Agência de Talentos de Pernambuco

4.      Amigos da Terra – Amazônia Brasileira (SP)

5.      ANCED – Associação Nacional dos Centros de Defesa de Direitos de Criança e Adolescente – Seção DCI Brasil

6.      Articulação Caminhada de Terreiro de Pernambuco

7.      Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa – ANCOP

8.      Articulação Nacional dos GTs de Urbana da AGB

9.      Associação Brasileira de Documentaristas e Curta-Metragistas, Seccional PE/Associação Pernambucana de Cineastas – ABD-APECI

10.  Associação Brasileira de Ensino de Arquitetura e Urbanismo – ABEA

11.  Associação de Rádios Públicas do Brasil – ARPUB

12.  Associação dos Geógrafos Brasileiros – AGB

13.  Assembleia Nacional de Estudantes Livres – ANEL

14.  Associação Pernambucana de Defesa da Natureza – ASPAN

15.  Auçuba – Comunicação e Educação

16.  Articulação Caminhada de Terreiro de Pernambuco

17.  Biodiverso Soluções

18.  Casa da Mulher do Nordeste (PE)

19.  Central dos Movimentos Populares – CMP

20.  Central Sindical e Popular – CSP Conlutas

21.  Centro Acadêmico André da Rocha Direito/UFRGS – RS

22.  Centro Acadêmico Silvio Romero Direito/UFS – SE

23.  Centro Acadêmico Tobias Barreto Direito/UNIT – SE

24.  Centro das Mulheres do Cabo (PE)

25.  Centro de Cultura Professor Luiz Freire – CCLF

26.  Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Distrito Federal – CEDECADF

27.  Centro de Direitos Econômicos e Sociais – CDES (RS)

28.  Centro de Estudos e Articulação e Referência em Assentamentos Humanos – CEARAH Periferia (CE)

29.  Centro Dom Helder Câmara de Estudos e Ação Social – CENDHEC

30.  Centro Popular de Direitos Humanos – CPDH

31.  Coletivo de Luta Comunitária – CLC

32.  Coletivo Marcha das Vadias – Recife

33.  Coletivo Midia NINJA (SP)

34.  Coletivo MUDA

35.  Coletivo Projetação

36.  Coletivo ZOADA

37.  Comissão de Ética do Sindicato dos Jornalistas de Pernambuco

38.  Comitê Popular da Copa de Pernambuco

39.  Comitê Popular da Copa de Porto Alegre (RS)

40.  Comitê Popular dos Atingidos Pela Copa de Belho Horizonte – COPAC-BH

41.  Conectas Direitos Humanos

42.  Conselho Regional de Serviço Social – CRESS/PE

43.  Coordenação Nacional da Central de Movimentos Populares – CMP

44.  Coordenação Nacional da Confederação Nacional das Associações de Moradores – CONAM

45.  Coordenação Nacional da União por Moradia Popular – UNMP

46.  Coordenação Nacional do Movimento Nacional de Luta pela Moradia – MNLM

47.  Defesa Pública da Alegria (RS)

48.  Diaconia

49.  Direitos Urbanos Recife – DU

50.  Diretório Central de Estudantes da UNICAP

51.  Diretório Central de Estudantes da FAFIRE

52.  Diretório Central de Estudantes da UFRPE

53.  Diretório acadêmico Fernando Santa Cruz Direito – DEFESC/UNICAP

54.   ECOSBRASIL- Associação Ecológica de Cooperação Social

55.  Equipe Técnica de Assessoria, Pesquisa e Ação Social – Etapas (PE)

56.  Escambo Coletivo

57.  Escola Comunitária de Artes e Reforço Escolar  – ECARE

58.  FAOC – Fórum da Amazônia Ocidental (AM)

59.  FASE – Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional

60.  FNA – Federação Nacional de Arquitetos e Urbanistas

61.  Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado de Pernambuco – FETAPE

62.  Federação Interestadual dos Sindicatos de Engenheiros – FISENGE

63.  Federação Nacional dos Estudantes de Arquitetura – FeNEA

64.  Federação Nacional do Estudantes de Direito – FENEDE

65.  Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal – FENAE

66.  Federação Pernambucana de Cineclubes – FEPEC

67.  Frente de Luta Pelo Transporte Público PE

68.  Frente Independente Popular de Pernambuco – FIP/PE

69.  Fórum Amazonense de Reforma Urbana

70.  Fórum de juventude Negra de Pernambuco

71.  Fórum Estadual de Reforma Urbana do Rio Grande do Sul

72.  Fórum Pernambucano de Comunicação – FOPECOM

73.  Fórum Sul de Reforma Urbana

74.  Fórum Urbano da Amazônia Ocidental – FAOC

75.  Frente Quilombola (RS)

76.  Fundação Centro de Defesa de Direitos Humanos Bento Rubião (RJ)

77.  Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares – GAJOP (PE)

78.  Giral – Comunicação e Juventude

79.  Greenpeace Brasil

80.  Grupo Cactos – Comunicação e Gênero

81.  Grupo de Trabalhos em Prevenção Posithivo – GTP+ (PE)

82.  Grupo João Teimoso

83.  Grupo Mulher Maravilha

84.  Habitat para Humanidade Brasil

85.  Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social

86.  Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas – IBASE (RJ)

87.  Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero – ANIS

88.  Instituto dos Arquitetos do Brasil no Rio Grande do Sul – IAB (RS)

89.  Instituto Terra, Trabalho e Cidadania – ITTC

90.  Mídia Lunar

91.  Movimento de Assessoria Juridica Universitaria Popular – MAJUP

92.  Movimento de Luta pelo Teto – MLT (PE)

93.  Movimento de Luta Popular e Comunitária – MLPC (PE)

94.  Movimento de Moradia Popular de Pernambuco – MMPE (PE)

95.  Movimento Ecossocialista de Pernambuco – MESPE

96.  Movimento Nacional de Direitos Humanos/PE

97.  Movimento Nacional de Luta pela Moradia – MNLM-BR

98.  Movimento Negro Unificado – Pernambuco

99.  Movimento Sarau Debaixo – SE

100.  Movimento dos Trabalhadores Sem Teto – Pernambuco

101.  Núcleo Educacional Irmãos Menores Francisco de Assis – NEIMFA

102.  Observatório das Metrópoles (RJ)

103.  Observatório Transdisciplinar das Religiões no Recife

104.  Organização e Luta dos Movimentos  Populares – OLMP (PE)

105.  Partido Pirata

106.  Plataforma Dhesca Brasil

107.  Pólis – Instituto de Estudos, Formação e Assessoria em Políticas Sociais (SP)

108.  Ponto de Cultura Espaço Livre do Coque

109.  Praias do Capibaribe

110.  Rede Coque Vive

111.  Rede de Jovens do Nordeste

112.  Rede Jubileu Sul / Brasil

113.  Sambada Coco dos Amigos

114.  Serviço Ecumênico de Militância nas Prisões

115.  Sindicato dos Metroviários de Pernambuco

116.  Sindicato dos Rodoviários do Recife e Região Metropolitana do Recife

117.  Sindicato dos Trabalhadores do Comercio Informal do Recife – SINTRACI

118.  Sociedade das Jovens Negras de Pernambuco

119.  Sociedade de Apoio à Luta pela Moradia SAM/MNLM – BR

120.  SOS Corpo – Instituto Feminista para a Democracia (PE)

121.  Terra de Direitos

122.  União dos Estudantes Secundaristas de Pernambuco – UESPE

123.  Vídeo nas Aldeias